Outro

Cortinas dobradas em inúmeras linhas,
e voltas, e pequenos detalhes,
que passam por nossos olhos
como pessoas numa densa multidão.

Mas estão ali do topo a seus pés
e dos pés à cabeça…
e nós aqui, em lugar nenhum…
desconfiados, ansiosos,
vivendo no mundo do “esqueça”
– por não saber como estar ou como ser.

Cortinas dobradas em inúmeras linhas
dialogam com a face gélida da janela vazia,
escondendo o mundo em suas costas,
cerrando nossos olhos para o exterior

e confundindo nossas mentes voltadas para fora,
jamais para dentro.

Viral

Aquele garoto que atravessa a rua
olhando para a garota falando no orelhão…

jamais será um grande escritor…
jamais será um grande artista…
um músico, filósofo, empreendedor
ou jornalista.

Será apenas mais um. Será igual.
Igual aos outros escritores,
artistas, músicos e filósofos…
empreendedores e jornalistas.

Talvez venha a ser como a garota.

Sei lá.

Abstenho-me dos hospedeiros para não ser infectado
pelo o agente da mesmice.

Romantismo fajuto

Ó, amada dos lábios que rugiam…
despertaste o amor em mim
ao ver-te como uma rosa nua num jardim
enquanto despia versos que fugiam.

E sem teu encanto a mim presente,
que se faça de teu riso, o pranto,
da agonia enraivecida, teu canto
de minha vida, a morte iminente.

Resposta

Não pensamos em tudo.
Às vezes uma palavra, um conselho
ou um simples poema, como este,
saciam nossas cabeças ansiosas
– de forma a iluminar os caminhos
tortuosos da incerta vida.

Sorte acontece. Abracemo-na.

Imperfect Sonnet to the Wharf Poet (translated)

Clocks with no hands and torn
newspaper sections
print mental images:
masked and insecure.

Tish, the hermit that manages my learning
shares his old soul with my fetus-body…
and all I absorb is what I let
being absorbed – unconsciously

From the grizzled beard to the no-prudence-poems,
the wharf old man, stranger emigrant,
the wise-words-man, Buddhist by blood

Only divagates , as I, searching
For something in common with the poetic livers:
hands, glue… and internal security.

Diverse Poem (translated)

Upset for being thwarted
by the silence that echoed in the living room
when they read the fruits of his planned poem
that sleeps and let its verses rest.

From the blue and starry sky to the blackness of closed windows,
I dreamt of seeing a dark world, full of painted stars;
I dreamt of seeing human people and the moon man
walking, bringing hope to my naked face.

I have never been Shakespeare or Rimbaud, I’m not Poe and won’t be Neruda.
I’ll be myself and nothing much, for being this way,
because every word I speak or write will be deaf
and will hardly vary as time goes by for me.

And the music that sounds, sweats from my depths,
and the chords, the steps they dance,
the happy faces, scattered people, strangers,
don’t get lost, never get tired.

I’m the variant poet, the oscillating poet…
I’m like a bird that glides in its imagination,
I’m the accompanied poet, lost in loneliness,
I’m a full train that derails.

On this side, the future – on the other, ancient mansions.
On that, decassyllable ladies, machines and sparse letters
suspended, watching old lanterns and scarse memories
from this youth, myself and I in my lying emotions.

Identify with my life written here;
read and savor my unhealthy and unrestricted poetry;
sing your original songs and don’t copy others;
live with happiness – so the world won’t gain another dead poet.

Soneto imperfeito ao Wharf Poet

Relógios sem ponteiros e cadernos
de jornais rasgados
estampam imagens mentais:
dissimuladas e inseguras.

Tish, o eremita que rege meu aprendizado
cede sua alma velha a meu corpo-feto…
e o que absorvo é apenas o que deixo
ser absorvido – inconscientemente.

Da barba grisalha aos poemas sem tino,
o velho do cais, emigrante estrangeiro,
sábio das palavras, budista de sangue

Somente divaga, como eu, em busca
de algo comum aos poéticos viventes:
ponteiros, cola… e segurança interna.

Amizade e coleguismo

A maioria é substituível,
assim como eu,
para parte dela.

A minoria é de cada um.
Mas cada um não sabe
quem dela faz parte,

porque o colega mais chegado
é o amigo por conveniência,
não o irmão de outro sangue.

A maioria é substituível.
Sim.
Mas não você.

Não para mim,
Não para alguém.
Alguém certamente não substituível

Também para você.

E nesse vai e vem,
descobrimos, aos poucos,
quem importa para nós.

E os que se foram…
se foram…

os que permaneceram,
estão aí.

Podem ir embora?

Sim.
Mas quem sofre com o futuro
somente deixa o presente escapar.

Comprimido

Lúgubre
  Um
     Vasto e
       Oculto
          X

                  se espreita em minha cabeça

e
       as noites de sábado se tornam pesadelo;

e os domingos angustiantes

e, quando a semana começa,
   
                meu sofrimento segue seus passos.

                                     

                                 Agora, sem grandes desejos e projeções,

                             sem grandes amizades,
           
                        sem grande interesse…

                                       tudo que a mim encontra
                                       
                                                 se distancia sem hesitar
                                                 
                                                              – imitando meu isolamento.

Lúgubre
Um
Vão e
Odiado
X

Mergulha em mim
Enquanto

Meus
Amigos
Tratam de
Ocultar meus problemas
Um a um.

                                                                                Os brancos e redondos;
                                                                                Os pequenos e cilíndricos;
                                                                                Os coloridos e triangulares…

                                       são todos meus amigos.

             Companheiros de noites…

                            supostos refúgios.

                                                                                                  Pena sempre chegarem na mesma hora.
                                                                                                  Pena sempre chegarem em má hora.

                                                                                                  Samobójców,

                                                                                                  Uma pena não ter-lhe como colega agora.

O eu mais seu que meu

Enquanto falam, divago
vagamente
por minha cabeça dispersa,
e assim encerra,
sem sair de si,
o que chamo de digressão pensante.

Não sou comum;
jamais fui mundano…

Estou perdido em algo (em mim),
que nem mesmo conheço…
que nem mesmo reflito
ou tento descobrir
profundamente…

O fim de minha diáspora interna
resume-se à fuga do eu,
que remete ao externo
e infindo enigma de mim.

Mas não entendem,
porque não vivem,
que meu cansaço nunca foi físico
e que envelheci apenas mentalmente…

Não percebem
que aos poucos morro…
e que minha mente se encerra,
sem sair de si mesma,
como um singelo e flagelado
poema incompleto.

Poema sem rimas ou versos;
poema não definido,
sem conclusão.

Poema que torna meu eu
mais seu que meu;
poema que foge de mim
enquanto minhas palavras
corroem-se em dispersão.

Relativo

A realidade realmente não existe.
Nega sua forma mentalmente
nas cabeças dispersas, individualmente,
enquanto anunciam o “real” em riste.

Se, para mim, versos versificam o nada,
para outro, a poesia agrega.
Mas, enquanto o poeta poeta se nega,
tornarei minha escrita abandonada.

A realidade realmente é relativa.
Transfigura-se em pensamentos distantes,
que se alinham em diversos instantes
na cabeça do povo, irreal e inativa.