justa picuinha

afogaram-me incessantemente
em segredo
pedras sombrias se ocultaram nas sombras
mas me disseram que elas nunca ali haviam

afogaram-me em suas poças de existências rasas
e jamais atestaram meu silêncio

mas a violência em pedras veio
em segredo
o pano foi passado no sangue desbotado
que pollockeou de minhas insistentes
preocupações e agonias

limite para bondade não se mede
se impõe
o que se quer dizer?

raízes e amarguras enraizadas se aprofundaram
no solo infértil

os frutos que colhi foram frutos?
colheita desperdiçada injusta maldita

jamais me escondi
até mesmo quando estive no precário submundo de mim
envolto por imundícies causadas por outrem e por mim

a mim
estava revelado
o que disse desdito
o que tive destido
o que pensei
invadido e invertido

engasgaram-me pelo desgosto
da perplexidade
só extraio frustrações
espero em meio à neutralidade segura
portanto

impuseram a espera do inominável
humanidade é resto de rastro a ser eliminado

disseram-me o homem enforcado
e enforcaram-me pelo apelido
mal sabiam que eu mesmo
já havia me enforcado há muito tempo

auto erosivo

antes da palavra
toda palavra me foi compelida

arbitrárias e desunidas
fogo e cinza surgiram
à angústia incontida

antes do poeta
houve alegria

o silêncio se alastrou
e o incêndio ensimesmou
tudo que aqui existia

na beira da ruína
que pode fazer um verso
de pródiga origem?

diante de mim
soergue-se a poeira
que desenxergo

e a poesia que disseram existir
não era senão minhas
retinas

poeta poeta poeta
apaga-se a chama
e autoproclama
um status que nada diz

pisoteia significados
e todas as estrofes
sangram feito fagulha

perfuraram-se e se esqueceram
do estrago
engasgo e engasgo ainda
estou desolado

estendiam e se entupiam de brilhos
a opulência e suntuosa existência
pareciam aurora alheia
esfaqueando suas foscagens

o que resta resta pouco
poema torpe de poeta eloquente
que ainda treme suas mãos e soluça
sua mísera voz para recitar seu verso

insignificante