Misantropia II

É tarde… e já estamos distantes.
Os pássaros cantam a poesia,
mas não cantam como antes.
O céu é o véu que a ti entrelaça
e te leva de mim em doce ameaça.
Sou eu quem foge à melancolia.
Não controlo sentimentos…
Tudo ainda são tormentos…
Tudo é misantropia.

Dévotion II

Meu coração se alimenta de tuas sombras errantes, de um amor em luto, de pérfidos sentimentos que senti, outrora, partindo das falsas impressões que, por meu próprio descontentamento, mais uma vez, me tornaram docemente infeliz. A triste sedução que vem de ti, meu amor, já nada me traz. A simplória emoção de estar a teu lado, meu amor, já não me satisfaz… Erga a cabeça, meneie os braços, mostre teus sentimentos, tuas quimeras, teu tão partido coração! Estradas bordejadas por ódio e corrupção sustentam teus membros descaídos em tentação, senão divina; iluminação e perdição, senão as minhas. E, ainda, meu coração se esgueira procurando teus lábios verdes, teus raios, perfumes e púrpuras… Ainda sei onde encontrar-te, meu amor. Ainda sei. E é por isso que, todas as noites, antes de dormir sonos eternos, deito contigo na alcova onde repousa tua carcaça, sabendo que tua alma permanece a meu lado.

O Misantropo

Humano, demasiado humano,
não sou eu quem segue o plano
preparado para aliciar e acalentar
a paixão e amor do são insano.

Não és tu que vê a vida
sobre o orgulho e a ferida
de homens tolos, de tempos idos…
homens frívolos, corrompidos.

Humano, demasiado humano,
onde se escondem seus tesouros de Guano?
Onde estão a podridão inefável
e a paixão e amor do são insano?

Não és tu que segue a luz
da doce miséria flux
– sobre a névoa e o orvalho,
sobre os bosques de pinheiro e carvalho.

Dirás que sou o misantropo, em sua defesa,
e que, a ti, tenho aversão como proeza.
Mas só não tenho habilidade ou destreza
para lidar com o que, a mim, considero pobreza:

O humano, demasiado humano, dos tempos de agora.
Que venham os imponentes casarões de outrora,
que deixem os bobos, tolos e levianos para fora
enquanto escrevo meus versos de misantropia, por ora.

Humano, demasiado humano,
não és tu que segue o plano,
não és tu que vê a vida
sob o orgulho e a ferida

de homens verdadeiros, de tempos idos,
mas de homens frívolos, corrompidos.

Goethe

Escrevo versos em sépia
para as sombras da noite
enquanto os garotos nas
bicicletas cantam e fogem
dos homens de outrora.

Abria Goethe sobre a mesa,
copiava versos de antanho
e me sentia voraz, astuto,
mais eloquente do que o poeta
velho e estranho.

Mas tudo era um sonho
de menino, um sonho de poeta,
a vontade de ser quem não se é.
Tudo era Fantasia, Fausto, poesia…
a vontade de deixar de ser o que se é.

Olhos Teus

Ame a mim com olhos teus,
e amarei a ti com a reflexão dos meus.
Através das retinas, entre a mente
e o coração, amarei a ti somente
e tudo que vier de tua amplidão.

Ame a mim com olhos teus,
e amarei a ti com a reflexão dos meus.
Por trás dos versos, do poeta através,
por onde andarão, ao perigo, ao viés,
tudo que vem a mim é tua imensidão.

Todos os sutis e temerosos pensamentos
são a respeito de tua perda. Não
deixo de lado a confiança, mas o medo
de perder-te é tremendamente imensurável.
E o poema que me deste… inefável.

Todos os sutis e proveitosos momentos
são a respeito de nosso amor. Não
somos como a chuva, não nos molhamos
em meio à felicidade. Não somos parte da realidade.
Não somos parte um do outro.

Portanto, ame a mim com olhos teus,
e amarei a ti com a reflexão dos meus.
Através das retinas, entre a mente
e toda amplidão, amarei a ti somente
e tudo que vier de teu coração.

Determinante

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Ao fechar as portas de minha mente,
não quero que se perca em solitude,
em pesadelos obscuros, em meu sangue
desbotado como a bandeira desta pátria.

Quero que entre com seu céu em meus olhos,
negros como o próprio céu noturno.
Quero que revogue as sombras, que afaste de si
o mundo cruel através do que te caracteriza: o amor.

G.

Talvez teus olhos regressem a sua
quietude enquanto eu, calmo e distraído,
persigo a palpitação de teu coração amarelo,
o doce soar de teus lábios, o riso que me contagia.

Assim, tu e eu procuramos em todas as coisas,
o que amamos, mas ainda amamos pouco.
Não temos um ao outro, não temos a esperança
dum mar esverdeado, do céu infinito, de um amor inefável.

Estamos cegos: ainda buscamos na estirpe,
um simples amor prestante, baseado na saudade;
ainda temos vontade, porém calada, porém triste,

desanimada e resistente. Resistentes estamos.
E já não sabemos se um dia nossos olhares se encontrarão,
dizendo um ao outro um sutil e característico “eu te amo”.

Amor, não é amor se escrevi
vagos poemas de profundo sentimento,
para te mostrar a ti
por um caloroso e breve momento?
Não é amor se me fiz ausente para estar presente
em teus sonhos, desejos e vontades?
Por meio de palavras errantes e eloquentes
te proporcionei instantes de doída saudade.

Narciso

                     Cruzadas, tuas pernas.

                                                                Embaraçados, teus braços.

                                   Um jogo de perguntas sem respostas.

                                                                          Beijos, carinho e abraços.

               Delator, teu coração.

                                                                    Perdido, em tua amplidão.

                          Simples, a poesia.

                                                                    O fim, o começo e o desvario.

                                         Solitude e melancolia.

                                                                                  Corpos destinados ao vazio.

                     Delator, teu coração.

                                                                                        Perdido, em tua amplidão.

                                  O que o homem faz,

                                                                          senão encontrar em ti

                                      conforto, amor e paz?

                Lábios tocando a face.
                   
                                                                           A trama, o som, o desenlace.

                        Acariciando a própria tez, Narciso.

                                                                Um poeta indeciso…

                                                                                        amando sempre como na primeira vez.

O Cavalheiro dos Sonhos Delirantes

Vestido de negro, caminha só por licencioso festim:
os lábios mudos, os pés, opacos, marchando lentamente,
os olhos desatentos, as melenas esvoaçantes e a mente
triste. O cavalheiro dos sonhos delirantes vem a mim.

Pálido, arrogante e deveras refratante, espelha, dormente,
o que se foi antanho. Vive do passado, e passa, assim,
por todos: de soslaio, ególatra, soberbo. Eu, a mim,
somente digo que jamais serei o cavalheiro irreverente.

Porém, antes de ser quem sou, fui um tanto parecido
com o que se propõe a ser quem não se quer
ter por perto – um adversário, um desafeto, um inimigo descosido.

Mas, ainda que tenha a oportunidade de mudança,
nem todos estão preparados para tal, por tudo que isso requer.
Somos escravos da rotina, de nós mesmos e da matança

que vem de dentro para dentro.

Inerência

Não procuro as palavras
que escrevo para ti
em tua própria existência.
Procuro em tua amplidão,
em teus anseios e vontades,
em teus beijos e alardes,
em tua despedida e acuidade.

Não procuro versos em teu corpo.
Não procuro estrofes em tua mente.
Se estou ausente, estou, somente, um pouco.
E, pouco a pouco, sou parte tua inerente.

Enfim

Andaste pelas sombras das vielas
de meu coração amiúde, e nele
viste homens ocos e solitários
desprendendo-se de minha visão
turva, oca, diminuta em sua plenitude.

Caminhaste por meu vasto império,
minha pequena monarca,
onde tudo era cinza, perdido,
silenciado, mas jamais decaído,
alheio, indiferente, abandonado.

Vacilaste, meu amor, pela penumbra de meu ego
altruísta e ególatra. Todavia, nada era meu,
senão as perguntas que fazia a mim
mesmo para permanecer são.

Aqui, onde os olhos desbotam em lágrimas,
vejo a ti qual um vulto resvalado,
mas estou ofuscado por teu brilho,
ensimesmado, lento, apaixonado…

Porém, neste vale de dimensões
e depressões infindas e infinitas,
só eu sei que és a cura para a morte iminente.

Só eu sei que és o segredo
e o enigma, o vulto e a luz,
o amor e a paz de minha doída mente.

Perdoe-me por amar-te
e por te mostrar o que se esconde em mim.

Mas, para amar e receber amor,
deve-se conhecer a profundeza daqui…

onde os olhos começam a brilhar por ti.

Estirpe

Lâminas de sol se dispersam
em sombras ineloquentes,
frouxas, arrochadas,
sombras coléricas de olhos
melancólicos, tomados pela
lágrima, angústia e agonia.
Homens vazios, repletos
de insatisfação estrondam
o frêmito entre as mãos
e o pulsar do sentimento.
Mas não o alcançam.
Estão distantes, ocos,
perdidos em pensamento,
em suas mentes frias e
igualmente trêmulas.

Nem mais um passo!
O reino da morte se dispersa
em solidão e quietude.
Os olhos ainda escorrem
pouco a pouco, gota a gota,
os sentimentos alheios, sem brilhar,
sem sofrer (agora que quase todos
se foram), sem ser digno de pena,
honra, ou qualquer outra coisa.
Todos, juntos, tateamos o solo
à procura da sede e fome.
Contentamo-nos com o pouco,
com o mistério da ilusão
e também do espírito oco,
sem alusão à mais alta estirpe
da imaginação.