A agonia acompanha o sofrimento

Escrevo pelo desprazer de escrever angústias. Para atribular meus leitores. Para atribuir ao descaso razão de ser: a tristeza é, por vezes, vista como algo intocável, algo a ser evitado, mas, ainda sim, é parte da vida.

Absortas em velhas e revelhas tentativas de descrever a dor que sinto, o mundo que me cerca, o amor que me contamina e engrandece, as ideias esparsas de um escritor difuso e abissal parecem ser trazidas e traídas pelo inferno. Fim. Um novo começo. O desgosto do convívio amoroso, o isolamento próprio e familiar, o esquecimento de amigos outrora tão queridos… Não. Já não me fazem falta. Talvez tenha me esquecido, eu, da solidão. Talvez tenha extravasado tudo em lâminas e cicatrizes… e os poemas lunares se perdem no âmago solar do sofrimento contíguo.

Fracassamos, é verdade, e, enquanto humanos, erramos e não medimos o valor do erro. Ainda me encontro preso a uma fase melancólica de escrita. Fui laminado, fatiado em pequenos fragmentos que agora se perdem nas mentes alheias. Cada um como pecinhas de um quebra-cabeça que se encaixam com mais de uma peça. Cada peça – outra, sem ser minha – transformando meus pedaços de nada em alguma coisa. Essa fase, a da tristeza, pode até ser confundida com depressão, o que seria muito bem aplicável no meu caso. Porém, a diacronia de meus versos, a temporalidade e anacronia de minhas palavras (que só são anacrônicas porque tendemos à simplificação) são somente parte de meu maior objetivo: não ter objetivo.

Ainda, minha agonia acompanha o sofrimento.

Não tires de mim tua felicidade

Não tires de mim tua felicidade,

teu riso e complacência,
friso! tua grandiloquência
e tua sobriedade.
Não ocultes teu semblante,
erga a face e olhe profundamente
os olhos que a amam certamente
como faz nenhum outro amante.
Não empalideças o lírio,
a orquídea, rosa,
não sejas breve, lacônica ou prosa,
não lamentes teus martírios.
Por fim, não soluces quando partir.
Jamais em te abandonar pensarei;
a chama não se apagará, em mim não morrerei…
não penses nunca em deixar de sorrir.

Como barquinhos de papel

Por seus ondulantes cabelos caminho minhas mãos,
meus olhos excogitam a face, seus pés passeiam no ar.
Deitada, querida, em meu colo, é nuvem do desejo,
véu da melancolia ainda fresca, silenciosa e sombria

Breve em suas feições, sal de um mar espumoso,

leve em seus trejeitos e aversões, busca-me no âmago
de um amor dormente, puro, inocente e vultuoso.
No marulhar de suas mãos sobre as minhas, 
navego barquinhos de papel: veleiros em forma reduzida,
como meu amor, quando tento descrevê-lo num poema,
numa carícia ou num olhar atento, que passa despercebido.
Entretanto, lentamente começam a afundar, esses barquinhos,
pois não resistem ao contato com seu imenso estuário. 
Preferem a distância, a timidez, o silêncio e a secura. 

Darkness II

My struggled heart, my grasped brain 
and caged soul 
                         scream

I’m a liquid puppet, 
                               a product of weakness and blame!

We dread to be 
dead
and all my detested feelings seem 
to be lost.

How few are my emotions! 
                                            Yet, I will not tell you


what upsets, 
                      distresses 
                                          and makes me want to kill myself.

Still, through quietness and solitude,  
                                                          I make my own path
I am the champion of my life.
                                               I can die in peace right now.

Agonia

Breve em minha dor, ó meu desatino!
Foi-se o amor, já não vejo meu destino.
Angústia de quem viveu a inteireza
de uma vida pautada na tristeza,
calado e cansado de uma vida sem firmeza.

Breve em minha dor, ó pérfida memória!
Foi-se o amor, já não temos uma história.
Angústia de decadentes sentimentos,
que celebram a vida de tristes tormentos
e feridas, e instabilidade compulsória.

Há de matar-me em breve, doce melancolia.
Não suporto essa gente, e dessa gente a alegria!
Prefiro seus trabalhos e o que ele me propõe:
um fim digno, comemorado, pois só ele me repõe
o que foi deixado de lado: minha tão felicitada agonia.

Um (ex) amor infinito

Por um momento pude matar o maldito
sentimento de instabilidade e os choros
que me consomem desde o último namoro:
um misto de incertezas, um (ex) amor infinito!

Ela se foi e levou consigo toda a minha saudade.
Foi-se e levou consigo toda mágoa e agonia,
toda a merda, toda vida, toda alegria…
e, diante dos impulsos, disse que eu era filho da crueldade.

Tristeza. Éramos da penumbra envolta em nossos corações.
Mas ela não sabia lidar com a realidade e com suas emoções,
Não sabia perdurar um sentimento.

Tristeza. Estive breve e morto, prolixo e desinteressado.
Estive boêmio e deveras cego, cálido e magoado…
Já não distingo o amor do sofrimento!

Meu eu mais que repleto

Ah, como queria meus revelhos sentimentos,

meus intensos amigos e a insensatez dos tormentos
reunidos em minha cabeça neste instante
em que deixo de ser martírio para me tornar amante,
em que deixo a responsabilidade de lado e me viro infante.
Ah, como queria poder ser sem julgamentos,
como se todos voltassem, a todo momento,
os olhos para si, numa gestual indagação:
o que sou agora – que não fui até então?
Já não basta contar o tempo, à divindade, com a emoção.
Ah, como queria me matar em mim mesmo!
Como queria ser livre de qualquer relação.
Queria caminhar sozinho, a esmo,
estar somente com minha própria podridão!
Ah, como queria deixar de ser!
Como queria que me esquecessem por completo,
– meu eu mais que vazio ou repleto,
que agora se deixará morrer!

por onde fui, nada serei;
aberto, sempre, para a intensidade em versos,
o desamor de minhas árduas palavras
sente muito por dizer adeus.
ainda nos lamentamos por existirmos,
tristes, vagos e mascarados;
já não somos por sermos tanto
e os alheios ainda temem o desequilíbrio.
mas é bem verdade
que completamos nossa trajetória
unidos. por isso nos evitamos.
as luzes desafinam e estamos
sem nossa doída e apagada história
(que cagou e andou para nossos sentimentos diluídos).

Sofrimentos contíguos

Tuas carências são produto da mediocridade;

teus anseios e desejos, a merda da excentricidade;
tua perfídia te maldiz, ingrato; teus renegados são hostis,
tua podridão, por um triz, não me atinge, e, ainda sozinho, ris!
Tua morte iminente, teu sofrimento adjacente,
tuas contíguas cartas de suicídio e a dolorosa mente,
teus injustificáveis surtos de descaso e tirania
são parte de teu profundo sentimento de melancolia.
Deixa que deixem consigo a nervosa e soluçada treva!
Deixa que carreguem, inútil, teu corpo de uma vez!
Leva contigo e descarrega em ti a lágrima de uma leva
de poetas malditos, frios, tortuosos, filhos da insensatez.
Mas não ame a dor que sente, pois ela o espírito não eleva 
e somente resulta em tua morte e intrínseca aridez.

Observação egocêntrica

De desentendimentos – deixa-os abstratos – sigo vivendo uma vida atraída pela morte –

outras imagens atordoam a mente – sem que sinta a presença alheia ou a minha própria.
Ouço uivos de meu colegas – já cansados de tanto ouvir reclamar a existência.
Não estão interessados. Sinto isso. Não querem saber se estou bem ou não. É como se 
sentissem compaixão – a princípio -, mas fossem atraídos pelo egocentrismo, e enaltecessem
seu sentimento em detrimento do meu. Seus discursos são sempre compensadores. Compensam
a dor que um sente pela que o eu sente. Observo suas inquietações. Esperam a vez de falar. 
Esperam o momento certo de dizer: “ei, não ligo, também tenho meus sofrimentos.”
Pensei estar sozinho no mundo – e ainda penso -, mas consigo atenuar essa sensação ao me
deparar com meu próprio egoísmo. Alguns ainda se dizem altruístas – em meio a este mar de crescente individualismo – e temos nossos momentos altruístas, mas são ínfimos se comparados
ao oposto. 
Não confio neles.

poemeto qualquer

não conheço 
a genialidade por
completo.
às vezes
penso ter visto um vislumbre
uma cabeça repleta
em meio à multidão 
de vazios
mas logo cessa a ilusão
e volto a entender a existência
como vívidas e áridas
melancolias.
a angústia de quem vive
tantas vezes desfeita por paraísos 
artificiais
o ócio e desentendimento
tantas vezes nos guia
ao descaso 
tenho medo
de me perder em mim
como me perco em espelhos
quebradiços, estraçalhados.
mas não sou narcisista.
não sou humano.
sou apenas um reflexo
dando de cara com as 
paredes do mundo.