euxpropriado (as gentilezas do patrão)

trabalha a mão (sussurro apressado:
encanto e lamúria prazer e feitiço)
angústia o dia batalha retalha
(ópio e lúpulo [estresse!]): grundrisse

(falha e falha e falha e falha)
cesso o dia (resta a noite)
tv celular comida e cama
vesti o pijama (melhor me apressar)

navalha gentil (“te amo, querido”:
desbota-se o brilho é falho o motiço)
culpa e cospe, mutila e metralha
(de ódio tomado [a morte!]): sorriso

(falha e falha e falha e falha)
cesso o dia (resta a noite)
tv celular comida e cama
vesti o pijama (‘manhã vou sextar!)

trabalha a mão (peito queimado:
fagulha das oito às doze ao tiço)
entalha entalha esculpe um incêndio
(o mundo é este [burguês!]): postiço.

coa os grãos com que se nutre
leva-os ao fogo
não os cozinhes
retira-os da pressão
deixa-os em descanso.

não sirvas só, compartilha
processos, sabores, texturas
partículas do todo.

transforma as mãos
– não separes –
constrói
na substância tímida do encontro
a felicidade do sorriso.

Amor

eu te amo!
– diz alguém
e a carência arrefece
satisfaz seu desejo
projeta as tradições.

no amor, mutila-se o outro
um espelho para chamar de seu
possessivo imperativo
outro que meu
meu meu
quem poderá amar mais do que eu
que sou tão bom
tão perfeito
à luz dos meus olhos?

ainda não suporto a rejeição paterna.

o outro aniquilo.
aniquila o amor
fascismo oculto.










não serei herói da epopeia dos dias
não serei don juan que no ideal se cria
tampouco na bruma do íntimo farei-me
amor pra quem amo: presença, tempo, escuta.

eventualmente o que o peito perscruta
na distância urja em formatos distintos
mas do foco e do fogo e do fosco e da fuga
que enfim prevaleça o que de mais tenro sinto.

um eu, um outro

pixeladamente emburreci meus amigos com meu show telecinético
              hímen rompido descompassado caótico frenético em milhões de euzinhos   
              fragmentários que desinteressam, ó filhos algorítmicos
nas vielas dos stories paixão retina descarte de mim
              vazio que não foi receio não houve turbilhão imaginário 
              vela acesa igreja procissão reel altar post pai filho espírito santo alucinógeno
no asfalto quente pé descalço corre-corre o couro queima as costas torram noutro
              dia a dia de foder e romper-se em outro hímen que o homem exorta 
              em profundas olheiras e dor nas costas o trabalho adiposo o cenário odioso o
amor               
              oficioso a solidão maconhada lúmen lúpulo camarada
na visão turvada na fagulha incendeia a face não engulo fecho o olho colo   
              a boca corto a orelha e assim sou mais bonito
no espelho que não vejo o Lázaro de mim manequim vitrináceo trêmulo triste plástico
              kintsugi e kitsch que odeio não engulo e não digiro e não dirijo
              meu sonho-silêncio do exílio de idiotas do estímulo apatia milagrosa na fenda
              de minha ossada crianciforme que a quilômetros exala cheiro de sangue de
              horror e repulsa que insisto em intenso e esquecível manuscrito


angústia; no espaço
do criar, o vácuo
reativo

plateia imaginária
reacionária
planetária expectativa

do sucesso; o buraco
egoico – estoico prosseguir
criar sofrer erguer lutar
repetir
contra si: o peso dos sentidos:
cosmonauta inquebrantável no país dos oprimidos.

Esperança

do calor que a vista turva
a v
      i
        s
          ã
             o    s e d u z   e
e m u l a
u m   o á s i s   d e   f a r t u r a
no
mormaço a
                    caminhar

com os pés meus na quentura
dos perderes
                                                     (d a   l o n j u r a
dos quereres),
imatura
a vida
                                    a
p
r
e
n
d
e
             a engatinhar

nos alvéolos
                        t u f a   o   a n s e i o
na saudade
                                                      (o   d e v a n e i o
da existência) que não veio
no mormaço
a ausência-lar

mas então,
                             s
                             u
                             ave   e n s e i o
                                      s
                                   o
                                p
                             r
                       a ainda o vento; ei-lo
um destino (ou um e meio)
na secura, um emanar.

SOMA

recriar o que exista é reticência engasgada no peito mouco, soluçante, embebido em soluções entorpecentes, opioides, antidepressivos cachaceiros, violência gratuita no canal 50.000, afasia no encontro com o melhor amigo e a pessoa companheira. as aspirações de alguém como eu, tão ínfimo e cheio de mim, lamentando-me em pixel vazio ou exaltando-me em forma forjada, é roupagem para quê? no ápice da inexistência, somente as linguagens podem salvar o mundo – dizem, atordoados de tanto verso incompreendido, de reprodução de subjetividades estranguladas, tão ávidas por ser e não ser, pela fama e anonimato, pela vida e pela morte, desejo e prazer, angústia e calmaria… idealismo? não sei até que ponto é possível o escapismo ao que-seria, e da poesia nada se extrai senão aquilo a que já se estava condicionado, afinal não haverá leitores de versos longuíssimos e enigmáticos ou experimentais e herméticos – como queiram, há quem se ofenda -, no fim das contas, o que há por trás do que se avalia é espelho em fragmentos autoproclamados, kintsukuroi de si, autorremendo frouxo que amanhã substituirá o remendo do outro num copo de cólera e culpa, de arrependimento e mais fragmentação, misturando bíblia, rivotril e budweiser. é possível prever futuros, frutos, fundos do poço, fumos cósmicos de púrpura tonalidade de deuses humanóides de misticismo barato e eloquente enganação? humano-trator, rolo-compressor que tudo abraça – abraço rápido, apressado, enojado, frio, esquecível – vinde a mim em seus encantos! enquanto o mundo escorre de meus dedos, esqueço-me que quem o segura é quem meus olhos não abandonam.

um mesmo sol que todo estrutura
a aridez da humana lonjura,
na afasia de um sorriso encontra
um universo escaldante pro peito.

e tudo que vemos, infindamente
é, no céu aberto, encantamento
do que cerca e sonha e toca e fica
e que é eterno, feliz e sereno.

pouco tenho e pouco sou, na verdade
mar calmo em vestes de sal e de espuma
escondendo em si uma pouca penumbra
que segue e se verte em marola da vida.

embora o mar dos instantes às vezes soerga
ondas e areia onde o brio se perca,
no curso das águas que não formatamos
eu vou – e vais – e, então, nós vamos.

verso-pigmento o olho percorre
vista que funde sua tinta, na pele
rasgo-rabisco que lânguido e mole
fúria sutil no universo terreno.
confuso e transfuso existir na escrita
palavra-rompante, matéria; ser
um tanto abstrato que em mim habita
palavra que esconde um diverso você

Ressaca

conexão na afasia de um sorriso
onda de mundo sensível; o que se constrói?
o que se espera, o que se acredita
imersão em si – alhures.

plano, intimidade, afeto e alegria

mas, nos rochedos, fluidez de sentires
em atrito, teimosias calcárias.

amor?

bate a onda
outro corpo se vai