Perdi minha vida sem propósito

Perdi minha vida sem propósito
para um punhado de dores,
para a ferida que sangrou conjunta,
para uma triste lembrança disjunta,
para meu devastamento e melancolia.

Perdi minha vida sem propósito
na trepidez de meus versos,
na intranquilidade em que fui despejado,
em amores que não foram enamorados,
na angustiante distância e esquecimento.

Perdi minha vida sem propósito
na libertinagem de minha época,
em uma ou duas vãs poesias
nas noites tristes de lágrimas vazias,
em meus fúteis medos e fúteis agonias.

Para te esquecer

Para te esquecer 
vou eclodir

para não te ver

ou te ouvir

vou-me embora 
deste inferno
vou-me embora 
daqui.
Não é que não goste
de estar onde estás
ou de estar à espreita
ou pensar que retornarás
a meus pensamentos.
Aproveita!
que não me conheces
e não cries tormentos
acerca do que tenho 
escrito.
Para te esquecer
vou eclodir
para não te ver
ou te ouvir
vou-me embora
deste inferno
vou-me embora
daqui.

paraíso perdido

apesar dos dias
serem longos,
dos tormentos
serem tantos
e das inquietações,
que são incontáveis,
vivo esperando eles
acabarem.
em contrapartida,
se estiver certo,
terei paz
ao cair o pano
deste triste
e passageiro
espetáculo.
terei paz,
repito,
quando encontrar
o paraíso perdido
em meus
pensamentos.

O mais profundo dos abandonos

Quando a morte me convidar
a cerrar os olhos imaturos,
lembra de mim e não me esquece,
beija o rosto pálido e prematuro,
ousa sorrir e fortalece
o mais profundo dos abandonos.

Desde agora por mim chorando,
chora sem vergonha de fraqueza.
Mas chora por minha ausência,
pelo último gemido e o desejo
de um ser que viveu sem vida,
e se vai sem alegria… ou tristeza.

Buk

falávamos
enquanto 
esperava, deitado,
o entardecer de
nossas vidas
varrer sua alma
para fora do meu quarto.
sempre gostei da hora
de partir.
me parece que é quando
menos sentimos saudade
e mais nos vemos livres 
e livres daquilo que nos
perturbara tempos atrás.
de qualquer forma,
após a foda,
que foi excelente,
ainda conversávamos 
sobre sexo,
e meu anjo, rijo e 
compenetrado,
ainda se debatia 
entre suas pernas abertas.
nos abraçávamos,
nos beijávamos
mas, decerto,
estávamos distantes.
ela partiu sem dizer adeus,
mas não me fez falta.
nos objetificamos
e o preço foi uma noite vazia,
sem muito apreço e carinho,
sem trocas de olhares e palavras.
apenas sexo e um pouco de Bukowski.

Oblíquo

É óbvio, de certa forma,
que andei apático por um
ou dois tempos.
Estive estranho comigo mesmo,
e, toda vez que insistia em sorrir,
o pranto se instalava em minhas
entranhas plácidas e enferrujadas.

Foi-se o tormento, mas já não avistava
o horizonte de minha alma.
Doloroso, não? viver acompanhado
e ser deixado, perdido, na imensidão do ser
na vastidão do mundo…

Acho justo. Ninguém quer alguém ensimesmado
e depressivo rondando suas mentes
e fazendo troça de suas fúteis alegrias.

Até entendo que meu porto esteja fechado,
que minhas caravelas tenham afundado,
que meu mar, repleto de naufrágios, ainda esteja
se solidificando.

Mas não entendo… ainda não entendo o que me leva
à reclusão, o que me leva ao desespero sem motivo
e ao desvanecimento – de fora para dentro.

O mar está repleto de naufrágios, já o disse,
e ainda estou à deriva no poço de uma mente
sem esperança ou felicidade.

Infortúnios vão e vêm, mas a solidão aperta às vezes.
Não sou o tipo de pessoa que se vê feliz desbotado,
ausente ou até mesmo presente, mas sozinho.
Sou alguém, ainda, que preza pelo convívio.
Bom convívio. Boas memórias. Bons momentos.
Não os tenho, todavia.

Ah, quem sabe se não parti outrora e agora
vivo da ilusão que criei para fugir da realidade
que a mim desola?

Quem sabe se não deixei que a treva penetrasse em mim
como fazem os raios de sol à gente despreparada para
tanto sentimento?

Quem sabe, quem sabe…?

Infortúnio

É terrível me instalar em teu olhar,
em teus sabores e perfumes,
em teus morros, avenidas e volumes
e morrer sem te tocar.

É meu infortúnio estar no negrume,
na monotonia insalubre de teu mar
sem em tuas espáduas me afogar,
e mesmo assim sentir ciúme,

pois teus olhos ardentes me petrificam,
enquanto tuas ondas e marolas solidificam
o amor que sentes por outro.

Mas já te esqueço, querida minha, esqueço
enquanto, por sorte, de mim mesmo desvaneço
e morro pouco a pouco.

uma merda sem título

Estrelas luzem imagens arbitrárias
de minhas ideias tristes, mortuárias:
as alegrias e dores invertidas,
que vi passar por minhas mãos
como da areia suas cores queridas,
artefatos, fragmentos e grãos.
Dos seres que vi passar sem cores
só me resta a memória e o esquecimento:
angustiante visão, agoniante momento!
Tentam me calar a solidão, as dores,
me calar o enforcamento!
para me sufocar com falsas alegrias,
que não duram o tempo das orgias
de meus tristes e ardilosos sentimentos.