Canção de mim mesmo

Não celebro a mim mesmo,
e o que eu assumo ninguém assumirá,
pois cada átomo que me pertence
pertence só a mim.
Percorro meus sonhos e descaminhos
em busca de uma satisfação imperfeita,
de aspirações e inspirações inconstantes,
de uma alegria rasa, que seria o suficiente para me conter o sofrimento,
e que já não cabe em minhas entranhas:
poéticas demais para tanto sentimento.
Meus ecos transportam-me ao passado,
fruto do tempo e insegurança,
à angústia e incertezas de quem vive,
que somente o tempo pode transpassar.
Os beijos, as carícias, o afago:
intransponíveis e inefáveis lembranças, de fato,
mas quando as imagino, quando percebo
que estou me encontrando em alegres percursos de vozes dissonantes
que se completam e misturam,
minha própria voz, bafejada, ao léu, ao vento,
se perde nos limites do supérfluo,
nos diversos timbres das diversas folhas secas que preenchem o solo com cores e aromas…
que se matam à procura de um novo começo.
O tempo, criado, cria.
Porém, os sons e silêncios já não me atingem.
A escuta, da mesma forma, quase imperceptível aos sussurros e suspiros do relógio,
se faz ausente.
Perguntas, questionas, convidas…
mas estou muito velho para me lembrar de qualquer coisa.
Estou absorto numa solidão profunda e incurável.
Portanto, corto-te com um breve e falso sorriso reconfortante,
do tipo que olham e somente enxergam a voz:
há tanto perdida na superfície.
A voz, rouca e falha, a trepidez de cada nota…
o marulhar de teus olhos lacrimejantes
se estende aos meus anseios e impulsos…
A perdição está aqui.
Mas ainda espero tua mão estendida
para me socorrer da terrível canção de mim mesmo.

Vênus

Meus olhos beijam a eloquente fisionomia dos teus,
ora cerúleos, ora esmeraldinos, glóbulos sexuais
enquanto estendo meu corpo sobre o teu e me pergunto
onde devo parar de lamber teu aspecto – pálido e entristecido.

Tua cabeça deixa-se cair levemente magnificente e esplendorosa.
As duas orbes me examinam de cima a baixo… mas não resplendem sentimento.
Apenas o palpitar de tua ansiedade, outrora petrificado,
mantém-se vivo em meio aos mudos solilóquios de teu coração.

Isso é tudo que de ti entrevejo. Tudo que desejo e manipulo.
Contudo, minhas tentativas de reanimar teu espírito febril
são dissolutas, diminutas e dissipadas.

Estás morta dentro de ti, minha cara!
Estás absorta num mundo de perplexidades, extasiado e inundado
de sensações atribulantes. Não obstante, o que vês é o nada!

Meus olhos soslaiam, oblíquam e dissimulam tua imagem,
de certo, outrora idealizada. Martirizo-me, sôfrego, e desatento…
enquanto teus passos sutis erguem-me de repente.
Ainda respiras, ainda te moves, porém morres a cada segundo!

Teu vasto entendimento te fez sofrer, adorada.
Talvez agora saibas o que é o amor. Talvez saibas a que vim…
e, talvez, queiras sofrer junto a mim neste império catastrófico
que nos consome cada vez mais.

Isso é tudo que de ti entrevejo. Tudo que desejo e manipulo.
Contudo, não posso entrever doravante. Deixo o futuro à mercê do acaso e espera.
Viva, por favor, mas só se puder, que viverei contigo como escravo, amante, amigo…

Isso, repousa! Deixa a cabeça inclinar-se sobre meu ombro.
O afago é instrumento alternativo para o relaxamento.
Deixa que tenhamos um pequeno momento de dúvida e esperança,

de amor, de cólera… e sofrimento.

Consegue ver?

Consegue ver? Ninguém se importa
com a agonia alheia e o sofrimento.
Compensam a dor com o tormento
que penetra a face triste e morta.
Acostumei-me à podridão que me rodeia,
ao descaso que me preenche e desola,
à solidão que me corrói e isola,
à melancolia na qual o tédio canta e incendeia.
Mas não somaram à alma formidável;
entristeceram minha altivez e destreza;
conseguiram me ter como miserável!
Porque, para quem conviveu com minha tristeza,
apesar do sorriso inseparável,
meu suicídio não será surpresa.

Desgosto

Adeus! já não sinto tanto

por sofrer a vida que me incendeia.
O coração que aqui pranteia
desfalece em meio ao pranto.
Ah, deixa-me ir! Não prenda mais
meus tormentos e pesadelos em minha mente.
Exterioriza o poeta que, infelizmente,
não morrerá jamais!
Pois se morresse, seria julgado;
se morresse, diriam um eu amaldiçoado;
se morresse, seria vítima de meu posto!
Quero o fim em paz!
Não quero saber o que dirás!
Não quero ocultar-me em um triste e infinito desgosto.

Vida

Na fronteira da realidade
a solidão me agoniza

Então oscilo entre querer e não querer
estar acompanhado.

Quando estou em meus solilóquios mentais,
quando estou encolhido num canto de escuridão
pensando em como seria bom morrer agora…

quero apenas ser ouvido e dizer:

odeio vocês.
Não me abandonem.

Minha mente não é a mesma que foi

Minha mente não é a mesma que foi,
e tudo que pensei já se encontra
à sincera e obscura luz do desatino.
Enquanto as sombras de minhas companhias se dispersam,
e, ironicamente, se englobam entre si,
tento esquecer os versos que fiz.
Entretanto, passo a vivê-los cada vez mais,
torno a sofrê-los…
torno a lembrar de mim não como solução,
mas como erro…
Sou um poeta de um eu abalado, afinal:
Tive minhas visões, porém as abandonei.
Tive minhas sensações – e as desperdicei.
Gosto de revê-las, de olhá-las com um desprezível soslaio,
que, de desafortunadas lembranças, se fez desimportante, esquecível, invisível.
Quando me sentia eu, nem tudo eram rosas.
Todavia, o abismo que se abriu aos meus pés, a fonte de desesperança, o poço de lamentos…
É difícil lutar todos os dias contra si mesmo.
É difícil ter sido amaldiçoado e entregue aos trabalhos do esquecimento.
Pessoas passam docemente felizes – aos meus olhos,
amarga e rigorosamente infelizes.
Elas sorriem, elas cantam, apesar do cansaço e do sofrimento.
Eu não consigo.
Ainda me sinto sozinho – mesmo acompanhado;
ainda me sinto desamparado, mesmo trilhando meus próprios descaminhos.
O que vêem aqui já foi visto e revisto por velhos e revelhos olhos senis.
Já cantaram a canção de mim mesmo,
já exaltaram e exultaram de uma felicidade
que, infelizmente, não cabe em mim.
Devo encerrar os trabalhos por hoje.
Amanhã será um novo dia.
Torço para que não seja um novo fracasso,
um novo desespero…
Mas quero, talvez, ser mesmo esquecido.
Só assim poderei me atirar ao abismo que me envolve
sem causar dano aos tão felizes e alheios
demônios de minha mente.

I have seen my love

I have seen my love
and I’ve never held her to me.
I’ve never known her warmth, her beauty
nor the depths of her heart
– except the ilusion of images created by men.
No! I need to share an embrace,
my laughter, my pain, my love…
I want to look deep in her eyes (deep into mine)
and sing her a song many have sung before
– not as tender and truthfully as I.
Most of all, I love a love that loves but her.
A love that sings, lives and hurts… And grows each moment.
Unfortunately, I have only seen my love
in the light of thought. Sweet and beautiful thoughts.
When we finally meet,
she will rest on my chest and feel special.
Because she really is special to me.
And I will kiss her on the forehead and say:
“I don’t really care how distant we are…
I don’t really care how little have we talked…
I love you out of space and out of time.
I love you, I love you, I love you.”