Para além de afetos cindidos, há muito desejo um abraço: calor específico de músculos tesos e específicos, envoltos em minha solidão contínua, angustiante e específica, como se toda a angústia acabasse num estrangulamento afetivo, específico, que irrelevasse que é o peito o, de fato, estrangulado. Há tempos deixei de crer que a solidão seja sobre o outro e que todos que nos perpassam tenham qualquer compromisso com qualquer coisa para além de si. Sei de tudo isso e mais um pouco – e sempre insuficientemente. A fissura no peito, que tanto cativo – em repulsa -, afasta os braços que conheço, pois jamais poderão oferecer o refúgio certeiro do que fujo e do que me escondo. Seria injusto acusar-lhes dever. O abandono é frequentemente do abandonado, e a insuficiência esgota e desmobiliza. No entanto, apesar de muito conhecer, dentre tanto Narciso que me habita, falho em não me refletir. O abraço específico que almejo clama por atenção, mas por ser genérico, especial e não-especial para quem também é e não é especial, não decifro o que talvez pulule aos meus olhos. Busco outro em mim, e o vão de meus braços encontram somente o vazio de meus abraços.
Mês: maio 2021
Como escreve Paulo Mielmiczuk
Entrevista que dei para o José Nunes, do como eu escrevo
7 poemas de Paulo Mielmiczuk
Alguns poemas meus saíram no Amaité Poesias & Cia. Leia-os no link abaixo!
https://amaitepoesias.blogspot.com/2021/04/7-poemas-de-paulo-mielmiczuk.html
nas praias do meu país
talvez fosse dia e já de todo existisse
horizonte
alaranjado no além
pulso
do verso eunuco
além
cerúleo marulhar espumoso
a (náiade) onda me distrai
indistintas vozes de sal e saudade
em sibilos-ventanias
à concha de ouvidos
tudo é pouco ouvinte mouco
e talvez fosse dia
acontece que talvez
No décimo andar do Olimpo de Freud
onde haverá talvez tantos esmeros
dentre meus caprichos e desatino
dentre o breu, o orange e o bleu que amotino
haverá talvez paixão em meu Eros
e haverá paz e nenhuns entreveros
dentre errantes dispersos que escrutino
dentre humanos-autômatos, divinos
Tânatos nenhum em meus desesperos
Latifúndio
retira-se aos pecados
sacro sulco-sepulcro
santificai
tronco em riste e a face triste
raízes sem fim à terra aos pecados
lavra que acusa e acusa
recusa de tudo se usa
e destrói
larva da drusa e da gusa
abusa do solo e lhe usa
e corrói
e santificai
todo humano-eu
na chuva o arado lavrado o solo
pobre não produz
nesta rubra terra
que seu ralo sangue rega.
Sem tempo
dentre o todo que me escapa
algo ainda aqui cativo
se é carvão, incêndio ou brasa
no coração tudo imagino.
até antes do que penso
algo ainda aqui existe
um breu ao bleu, de todo imenso
no coração tudo resiste.
acorda, criança!
Gruta
tenho um plano que me tem
lúgubre fundo – mundo luminoso.
havia dias antes do dia
bélico, meu duplo
eu na peleja gargalhava
o murro na boca
curva
o morro na testa
e a gente ria! e se escondia
atrás da macondo os olhos abertos
já ardidos nos cantos de tantos soslaios
queda dupla de soco e tropeço
em ensolarada manhã o galo cantava
na face inocente
a gente ria
era de sorrisinho banguela
buraquinho
tão criança, tamanho marmanjo
a gente ria
do luminoso mundo – fundo abismal
tenho culpa que me tem
e quando cansou-se
foi-se, meu duplo
seco
ponto final no pescoço ao lado
da macondo
o tronco seco.
BRASILIA, SYLVIA PLATH (1932-1963)
BRASÍLIA
Sylvia Plath (1932-1963)
Tradução: Paulo Mielmiczuk (1995 – )
Hão de ocorrer,
pessoas essas com torso d’aço
dorso de asa e buracos
Esperam massas
da nuvem sua expressão,
Essa super gente! –
Meu bebê pregado
pregado, arrastado.
Rangem engraxados
Ossos à lonjura.
E eu, quase extinta,
seus tri dentes cortam-
-se em meu dedão –
E a estrela,
A velha história.
Na pista há rebanho e vagões,
Mãe terra, sanguínea.
Ô ser que fode
Gente como raios-luz,
Deixe este
Reflexo livre, presos
À aniquilação do pombo,
A glória
O poder, a glória.
BRASILIA
Sylvia Plath (1932-1963)
Will they occur,
These people with torso of steel
Winged elbows and eyeholes
Awaiting masses
Of cloud to give them expression,
These super-people! –
And my baby a nail
Driven, driven in.
He shrieks in his grease
Bones nosing for distance.
And I, nearly extinct,
His three teeth cutting
Themselves on my thumb –
And the star,
The old story.
In the lane I meet sheep and wagons,
Red earth, motherly blood.
O You who eat
People like light rays, leave
This one
Mirror safe, unredeemed
By the dove’s annihilation,
The glory
The power, the glory.