Às noites difíceis, num duro colchão
esverdeado, coberto com um fino
lençol branco, desperto de um sono
excessivo, que me consome e escraviza.
Nessas tristes noites, costumo abrir a pequena
janela engradada para ver o céu,
geralmente livre de nuvens e muito mais
azulado que os dias anteriores à minha vinda.
Um enfermeiro caminha a passos curtos,
verificando, em todos os quartos, se todos
ressonam seus sonos controlados. Sonos emocionados
e emotivos, que nunca mais teremos…
Depois da medicação, até fico mais sonolento,
mas sou muito esperto para me submeter
ao tratamento por completo.
Destoo, me finjo dormido e então vou conversar
com o estagiário, que, a esta altura, ainda é amável
conosco, os internos.
Porém, logo o enfermeiro-inspetor chega,
manda-me deitar e vigia meu sono.
Azar o nosso. Vidinhas de bosta, eu considero.
Queria ser livre, mas livre nunca estarei,
pois se não fosse confiscado de mim aqui,
seria em qualquer outro lugar.
As noites se repetem e a libertação nunca chega.
Ainda que seja diferente para mim, ou que me ache
diferente dos demais, sou igual – aos olhos psiquiátricos e sociais.
De que servem minha amabilidade, minha educação
e inteligência?
Não posso sair, repulso os outros internos…
repulso a mim mesmo e a forma como cheguei aqui.
Um novo dia virá, virá… trazendo mais infortúnios, deduzo.
Depois do breve café, ao raiar do dia,
me deito esperando a morte.
E virá, um dia virá.
Espero que antes do fim desta castração de sentimentos,
espero que antes da lobotomia ou dos choques
que sempre me prometem quando arranjo confusões.
Para isso, todavia, ainda guardo minha lâmina.
Carrego-a comigo para todos os lugares sem que saibam.
Ninguém a vê, somente eu tenho olhares para ela.
É como um dos inspetores… meu pequeno
“guardinha” pessoal, que me pune e pisoteia
quando algo de errado, para mim, acontece…
Infiltro-me, pernóstico, no panóptico desta
prisão e desligo as câmeras.
Mas já sabem que fui eu. Sempre faço isso
na esperança de correr, correr, correr..
Porém, toda noite voltam os inspetores para me vigiar.
Então,
me
alimentam
com mais
remédios…
enquanto isso, todos dormem sonos curtos, quase espasmódicos,
em seus confortáveis colchões, com cobertores quentinhos,
se preocupando apenas em acordar no dia seguinte, vivendo
vidinhas de bosta. Pelo menos existe algum movimento
nessas noites nubladas, pela janela.